Chronica de el-rei D. João I
Por Fernão Lopes
Capitulo XIV
"Estando em Braga Vasco Lourenço, irmão de Lopo
Gomes, depois que perdeu Neiva, como tendes ouvido, mantinha voz por el-reide
Castella, entendeu estava alli seguro, e n’aquelle dia que Guimarães foi tomado
começaram os da cidade de Braga haver razões com os do castello, que andavam
pelas ruas, sobre estas cousas que el-rei e o condestabre faziam; em tanto que
vieram haver arruido com elles, e começaram jogar ás cutiladas e ás lançadas
brandando os de fóra por appellido Portugal, Portugal por el-rei D. João, até
que encerraram os do castello dentro em elle, e começaram-lhe logo de tirar com
quatro engenhos que hi estavam, e logo em esse dia mandaram dizer a el-rei a
Guimarães, que era d’ahi tres leguas, que viesse á cidade, que já a villa
estava por elle, e que viesse tomar o castello, antes que houvesse algum
accorro.
El-rei
esse dia por noite mandou lá Mem Rodrigues de Vasconcellos e Martim Paulo
Gascon, cavalleiros, com gentes quantas cumpria, e escreveu logo ao
condestabre, que estava ainda na aldeia onde o leixamos, a par do Minho, com
certos homens bons de Braga, e lhe enviaram dizer que já Braga estava por elle,
que fosse tomar o castello, e que por quanto Vasco Lourenço o tinha por seu
irmão Lopo Gomes, e lhe podia mandar algum accorro, que lhe mandava que logo á
pressa se viesse á cidade e trabalhasse de a tomar.
O condestabre como tal mandado houve d’el-rei,
prouve-lhe muito d’ello, especialmente pelo embargo que havia de não poder
passar o Minho; e logo sem mais tardança á pressa partiu com suas gentes per
junto com Ponte de Lima, onde estava Lopo Gomes, e chegou a Braga e
apozentou-se na villa, que já estava por el-rei.
Em outro
dia mandou dizer a Vasco Louurenço que lhe entregasse aquelle castello pera seu
senhor el-rei, e Vasco Lourenço lhe enviou dizer que o não faria por nenhuma
guisa.
Entonce ordenou o conde de o combater, e mandou-lhe
tirar com aquelles quatro engenhos que achou na cidade, os quaes lhe tiraram
continuadamente por espaço de duas noites e um dia, de guisa que eram dentro no
castello alguns mortos e feridos. E vendo Vasco Lourenço que o não podia mais
soffrer, e que em elle não havia defensão, mandou mover preitezia com o
condestabre, pedindo-lhe por mercê que o leixasse ir em salvo, e aquelles que
com elle estavam com todo seu, e que lha daria o castello, a ao conde prougue e
recebeu-o logo, e elle sahiu d’alli com tão pouca honra, como partiu de Neiva,
e o conde ficou em posse da cidade."
Na segunda parte desta entrada tentarei analisar as técnicas de cerco e armas envolvidas nesta acção militar, mas principalmente, o que torna este cerco muito interessante como caso de estudo e explicar como o castelo de Braga tem uma importância histórica relevante devido à dualidade existente em Braga entre o poder clerical e o poder real.
Para a recolha deste texto foi utilizada a seguinte
edição:
Chronica de el-rei D. João I
Por Fernão Lopes
Bibliotheca de Classicos Portuguezes
Volume IV
Pp. 54-55
Lisboa, 1897
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